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                   Foto: Almécegas  
                    
                  ALTO PARAISO - CHAPADA DOS VEADEIROS 
                  17 A 19/11/2003 
                    
                  “Alto  Paraíso de Goiás é uma cidade na Chapada dos Veadeiros, conhecida como um dos  principais pontos de acesso ao Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. É  um destino popular para ecoturismo e turismo de aventura, com diversas atrações  naturais como cachoeiras, cânions e mirantes. “ 
                  Extraído do GOOGLE..  
                    
                  Jane  Carreira é artista plástica, formada pela Universidade de Brasília. Há mais de  10 anos que ela vive no Moinho, uma comunidade nos arredores da cidade goiana  de Alto Paraíso, junto à Chapada dos Veadeiros. Leva uma vida de retiro  voluntário, algo mística — mais porra-louca do que ideológica — depois que o  casamento fracassou. Mas não fica por lá o tempo todo: viaja com frequência ao  Rio de Janeiro e a Brasília, onde passa temporadas e até já alugou um quartinho  no centro da cidade de Alto Paraíso para facilitar a sua vida quando decide  participar de festas e eventos culturais, pois não tem condução própria e não  há transporte público para o Moinho. Costuma percorrer os mais de 10 km a pé ou  depender de caronas que são escassas. 
                     
                   
                  Eu a  conheci há menos de 5 anos, por intermédio de Zenilton Gayoso, que era  colega dela no curso de Artes Plásticas e, numa das viagens à região,  hospedamo-nos em casa dela. Acabei transformando-a em personagem de meu livro “Horizonte  Cerrado”, em que ela conserva sua história de vida, idiosincrasia, crenças  e valores, mas vive uma aventura amorosa imaginária. Ela gostou muito da  experiência de converter-se em personagem de uma novela e promoveu, através de  amigos, um lançamento do livro na Pizzaria Oca Lila, que é uma espécie de  centro cultural da cidade, com exposição de obras de arte, artesanato,  revelação de músicos da região, ponto de encontro.  
                     
                    Aceitei o convite com muito entusiasmo, pelo desejo de revê-la e de viver uma  dimensão diferente de minhas relações com o público. 
                    Fui de carro com o Nildo e o Zenilton foi de ônibus.  Encontramo-nos, quase na mesma hora de chegada, na rodoviária. Jane estava com  a amiga Jasmim, uma figura realmente incomum: veterinária mas, na verdade, vive  mais como guia turística e como curandeira. É voluntária de uma brigada de  apaga-fogo no cerrado. Pessoa inteligente, afável, muito interessante. Como  compõe um tipo humano diferente, já apareceu em foto num livro sobre a região e  em matérias jornalísticas da TV Globo. Gaúcha da fronteira, ganha algum  dinheiro cuidando dos animais em casa, mas deve encontrar o seu sustento em  qualquer tipo de trabalho, além de dedicar boa parte de seu tempo à meditação e  ao voluntarismo, sem maiores planos de vida. 
                    Jane queria que ficássemos hospedados no quartinho que ela aluga no centro da  cidade. Não havia espaço para todos nós nem colchonetes para isso — apesar da  insistência dela. Havíamos levado roupa-de-cama. Optamos por alojar-nos no  Hotel Nunes, local bastante modesto, mas limpo e seguro. 
   
                    Na noite de sexta-feira em que chegamos, fomos jantar na Pizzaria 2000, na  avenida principal, e terminamos a noite num bar-danceteria, para ouvir uma  banda bastante afinada e ficamos “balançando o esqueleto” no exíguo salão até o  início da madrugada. Caminhamos abraçados pelas ruas cêntricas, reconhecendo  lugares. 
                    Alto Paraíso estava um tanto vazia, com pouquíssimos turistas, lojas vazias,  restaurantes fechados, casas em construção paradas, um certo ar de desânimo. E  a crise que estamos vivendo que bateu muito forte por lá. 
                    Não obstante, a atmosfera  da urbe é magnânima, com uma população muito especial, figuras excepcionais,  realmente fora do “normal” se comparados aos parâmetros convencionais.  Artistas, artesãos, religiosos, místicos numa  sincretude cultural à margem dos comportamentos burgueses. 
                    Na manhã do sábado fomos à chácara da  Jane buscar umas telas dela para uma exposição na Oca Lila. Acabei comprando  uma delas, ostentando um lagarto em cores berrantes, trabalho muito  interessante. 
   
                    Continuamos na trilha de terras além do Moinho até ao Solarion, onde  estão as cachoeiras Anjos e Arcanjos.  
                    A região é exuberante, de mata densa, muito úmida nesta época do ano, com as  montanhas ao fundo.  
                    O caminho é difícil de subir. O acesso à cachoeira dos Arcanjos, só com o apoio  de uma corda. À dos Anjos não deu para ir porque a chuva que caía, ainda que  rala, havia inundado o acesso.  
                    A cachoeira visitada — a dos Arcanjos, mais acima, não era das mais  espetaculares, mas valeu a visita.  
                  Éramos  os únicos aventureiros naquele dia. A água muito escura, devido à decomposição  de folhagens e minerais da área.  
                     
                    Almoçamos num restaurante self-service de um gaúcho: comida muito boa e variada, com algumas iguarias incomuns e,  em seguida, fomos para os estúdios (na verdade, apenas uma salinha acanhada e  um equipamento primitivo de transmissão) da rádio comunitária. Tínhamos uma  entrevista com o Paquito, um radialista voluntário que também é cantor. De  noite, um bate-papo muito simpático sobre o livro Horizonte Cerrado, com  a participação da Jane, na condição de personagem, na tentativa de atrair  público para o evento na Oca Lila.  
                     
                   
                  Saímos  dali (sem a Jane, que ficou cuidando de seus afazeres) na direção da BR, na  direção de Cavalcante, onde o Zenilton queria fotografar o habitat de Dychia  baunii, que é endêmica, para um artigo que está escrevendo.  
                    O local é peculiar por causa dos detritos de pedras brancas, cristalinas, na  parte mais alta do platô.  As dyckias  sofreram com os últimos incêndios, mas nesta época, com as chuvas, estão  reidratando-se. 
                    Como as tardes na Primavera têm luz solar até mais tarde, sobretudo por causa  do povoado São Jorge, nas imediações da estrada do Parque Nacional da Chapada  dos Veadeiros.  
                    São mais 30 km de terra batida, mas a paisagem é magnífica por causa dos montes  e vales. 
                    
                    Entramos no Vale da Lua para fotografar os conjuntos de Dychia sp que  abundam sobre as pedras, na descida para as “crateras lunares” do leito do  traiçoeiro rio (quando chove nas cabeceiras pode provocar enchentes súbitas e  provocar mortes aos banhistas).  
                    Foi a primeira vez que encontramos uma dyckia — espécie de bromélia  suculenta, verde clara, com poucos espinhos  junto às inflorescências. Muita sorte a nossa porque ela floresce apenas no  final do inverno, na estação mais seca.  
   
                   
                  
                  Foto: Almécegas 
                     
                     
                  Nildo ficou  entusiasmado com as formações rochosas e bizarras, pelas covas subterrâneas até  ao fundo de um dos poços. Deve ser uma sensação impressionante, fora de minhas  atuais cogitações.  Bastei-me com  fotografá-la à distância. 
                    
                  De  noite teve lugar o “lançamento” do livro “Horizonte Cerrado” na Oca da  Lila. Começou muito tarde, depois das 10 da noite, com a animação do cantor  Paquito e do quarteto de músicos que acompanhavam-no e a seu parceiro Ubirajara  Júnior — o grupo “Colírio e Óculos Escuros”. Estavam tomando as imagens finais  para um videoclipe de promoção do novo CD, para o canal MTV. 
                     
                    Dei notícia ao público do conteúdo da obra, Jane relatou a experiência de ser  personagem viva de uma novela de ficção e distribuiu exemplares de minhas obras  recentes aos interessados.       
                    Estava na expectativa da chegada de minha amiga Lourdes Planas, que ficou de  aparecer com a sobrinha. Ela foi do corpo diplomático da Embaixada da Venezuela  e agora mora em São Paulo.  Elas não  apareceram e, depois do jantar, fomos para a boate Obas, nas proximidades, para  dançar. Além de Jane, do Nildo e do Zenilton, acompanhando-nos  Jassmim, vestida com uma indumentária fantasiosa e intrigante, nada  convencional, com uma espécie de roldo de pano, à maneira de um turbecléatante,  compondo um tipo muito impactante. 
                    O local da festa era muito rústico, apesar da modernidade das luzes da pista de  dança. O repertório muito eclético, variando do techno ao forró, do gosto da  garotada e dos mais velhos.  
   
                    Deixamos a Jane e a Jassmin às 2 da manhã, ainda muito animadas, pois elas são  dessas que ficam até o sol raiar...  
                    No domingo pela manhã, soubemos que a bolsa da Jane havia sido roubada com as  chaves do quarto dela, e com o pouco dinheiro que portava... 
                    A manhã foi toda para conversar com as nossas anfitriãs. Jassmin fez uma sessão  de terapia “Vela Hopi” no Nildo, com tubos feitos de gaze revestidas com  cera de própolis e alecrim e outros óleos de plantas medicinais. A vela  introduzida no ouvido e ao corpo enquanto derretia a vela, sugando a cera do  ouvido do paciente. 
                    Em seguida ao almoço tomamos o caminho de volta numa rodada só, sem parar  sequer para beber água. Fazia muito calor, com as nuvens de chuva.  
                
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